Dr. José Carlos Truzzi

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Incontinência Urinária na Mulher

A incontinência urinária pode ser definida de modo simplista como a perda involuntária de urina. Pode ocorrer em homens, mulheres ou crianças. Dentro deste conceito uma série de situações e doenças, transitórias ou definitivas, com mecanismos de ocorrência variados apresentam como fator comum à perda de urina. Pode-se dizer que a incontinência urinária é uma “síndrome”. Desse modo, ao nos depararmos com um paciente cuja queixa é incontinência urinária, devemos estabelecer o diferencial com um grande número de possíveis diagnósticos etiológicos entre os quais: a incontinência urinária de esforço, malformações congênitas, hiperatividade da bexiga, fístulas urinário-vaginais e bexiga neurogênica. Entre mulheres de meia idade cerca de 60% apresentam algum grau de incontinência urinária, sendo que somente um quarto destas procuram atendimento médico.

O restabelecimento da continência urinária promove melhora significante na qualidade de vida, bem como no convívio social e familiar. Descreveremos a seguir os principais tipos de incontinência urinária, os recursos diagnósticos necessários e as principais opções de tratamento.

Incontinência urinária de esforço (IUE)

A incontinência urinária de esforço é a perda involuntária de urina através da uretra íntegra, quando a pressão no interior da bexiga supera a resistência uretral, na ausência de atividade da bexiga. Este tipo de incontinência urinária ocorre quase que exclusivamente em mulheres. Essa perda ocorre habitualmente na presença de tosse, espirro, riso, ou esforços físicos, porém, dependendo do grau de comprometimento pode haver incontinência urinária mesmo estando a paciente em decúbito dorsal (deitada), com a musculatura relaxada, ou ao levantar-se e deambular. Nas formas menos intensas de incontinência urinária aos esforços há uma hipermobilidade do colo vesical, ou seja, a junção entre a uretra e a bexiga. O que leva uma mulher a ter incontinência urinária de esforço ainda não está totalmente esclarecido. Acredita-se hoje que fatores como a síntese inadequada de colágeno, falha nos mecanismos de reparação tecidual e outros defeitos dos tecidos de reparo, estejam envolvidos. Fazem parte dos fatores de risco a obesidade, o envelhecimento, o ciclo gravídico puerperal, neuropatias e traumas. A incontinência urinária de esforço pode encontrar-se, ou não, associada a cistocele (bexiga caída) e a outros prolapsos genitais como a retocele (prolapso do reto) e a enterocele (prolapso do intestino).

Cerca de vinte por cento das pacientes com incontinência urinária de esforço apresentam também uma atividade aumentada do músculo da bexiga (Bexiga hiperativa). Nesses casos sobrepõe-se às perdas urinárias por esforços, quadros de urgência miccional (vontade intensa de urinar, às vezes com perdas).

O diagnóstico da incontinência urinária de esforço inclui, como em outras patologias, a história clínica com sintomas e queixas apresentados pelo paciente, o exame físico geral, o exame dos genitais em posição ginecológica e ortostática (em pé) e o toque retal. O exame físico genital permite avaliar o estado hormonal local, presença ou não de prolapsos genitais e principalmente permite que se constate a presença de perda urinária através da uretra durante manobras de esforço abdominal ou tosse.

O estudo urodinâmico é o principal método de diagnóstico complementar da incontinência urinária. Tem por princípio simular o ciclo de enchimento e esvaziamento vesical cotidiano. Permite que seja avaliado o grau de incontinência, a presença ou não de hiperatividade da bexiga e eventuais distúrbios neurológicos com repercussão no aparelho urinário.

O tratamento não cirúrgico pode ser indicado como primeira escolha terapêutica para a maioria dos casos, no entanto, sua indicação mais usual se dá para os casos de incontinência urinária de pequena intensidade, para as pacientes em que está contra-indicado o tratamento cirúrgico e para aquelas que não aceitam o tratamento cirúrgico. Entre as opções de tratamento conservador da IUE temos os exercícios do assoalho pélvico para fortalecimento e melhor integração da musculatura, a reposição hormonal (nos casos em que é possível essa reposição). Ainda não temos um medicamento comprovado para melhorar a incontinência urinária de esforço. Alguns remédios (anticolinérgicos) e restrição de alimentos que causam irritação vesical como aqueles ricos em cafeína, refrigerantes e condimentos ajudam a controlar a atividade aumentada da bexiga (bexiga hiperativa), mas não promovem benefícios no tratamento da incontinência urinária de esforço.

Existe mais de uma centena de técnicas cirúrgicas para o tratamento da incontinência urinária de esforço. A grande maioria baseia-se fundamentalmente no reposicionamento do colo vesical. A colporrafia anterior (Kelly-Kenedy) foi indiscutivelmente uma das mais realizadas no século passado, sendo ainda hoje preconizada por muitos. Consiste em uma cirurgia por via vaginal. Seus resultados positivos variam de 30 a 60%, mas a duração da eficácia é reduzida.

A cirurgia de Burch é realizada por meio de uma incisão no abdômen. Apresenta em média 70-80% de cura em pacientes com até dez anos de seguimento. Suas principais complicações são a infecção cirúrgica e a retenção urinária, tendo sido, por esse motivo, substituída por outras técnicas. Atualmente o método de escolha para tratamento da incontinência urinária de esforço é a chamada técnica de "Sling". Trata-se da passagem de uma faixa abaixo do colo vesical e fixada no abdômen. Os resultados após cinco anos de seguimento são de 82% de cura.

Fístulas urinárias

As fístulas urinárias podem ser decorrentes de processos infecciosos, tumorais e principalmente associados a intercorrências cirúrgicas e radioterapia. De modo geral, podem comunicar a bexiga e a vagina, o ureter e a vagina. A perda involuntária constante de urina pela vagina, ou intermitente é o sintoma manifestado pelas pacientes com fístula vésico-vaginal. Nos casos de fístula uretero-vaginal a micção ocorre regularmente, sendo que há perda de urina via vaginal de modo contínuo. O exame clínico, a endoscopia e a investigação por imagem, habitualmente revelam a sede da lesão. O tratamento é cirúrgico e o sucesso encontra-se na dependência da escolha da técnica adequada para cada caso conforme a experiência do cirurgião.